quinta-feira, 26 de novembro de 2015

DISTRITO FEDERAL - Políticos do DF pediram dinheiro a postos que mantinham cartel, diz PF


Portaria da Cascol, uma das distribuiboras de combustíveis alvo de operação da PF e do Ministério Público (Foto: Gabriel Luiz/G1)

Ligações telefônicas monitoradas pela Polícia Federal com autorização da Justiça mostram o contato de políticos com mandatos pelo Distrito Federal com empresários suspeitos de montar um cartel de combustíveis na capital e no Entorno. O suposto esquema envolvia donos de postos e de distribuidoras, que combinavam preços de álcool, diesel e gasolina, segundo a investigaçãoAs chamadas aparecem em uma representação da Polícia Federal enviada à Justiça e assinada pelo delegado João Thiago Oliveira Pinho. O documento aponta que Antônio Matias, sócio da rede Cascol, fez quatro ligações para políticos entre 15h02 e 18h36  do último dia 2 de outubro. Matias está em prisão temporária desde a última terça (26).
Em menos de quatro horas, o empresário conversou com o deputado distrital Raimundo Ribeiro (PSDB), o deputado federal Izalci (PSDB-DF), o senador Hélio José (PSD-DF) e um membro do PSDB (não identificado por nome). O conteúdo das conversas não é descrito no texto.
Em nota enviada ao G1, Raimundo Ribeiro diz ter entrado em contato com Matias para "sugerir que o mesmo ajudasse no processo eleitoral do conselho tutelar". Segundo o deputado, não houve pedido de dinheiro nem conversa sobre qualquer atividade ilícita.
A reportagem  entrou em contato com o gabinete do senador Hélio José, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem. O parlamentar é o único político mencionado no documento que não pertence ao PSDB. A reportagem também aguarda retorno dos advogados de Antônio Matias.Izalci afirma que um assessor foi ao escritório da Cascol naquele dia para comprar "tíquetes de abastecimento", mas o caixa da empresa já tinha sido fechado. A ligação foi feita para que Antônio Matias autorizasse a transação fora do horário comercial, segundo o deputado. Ele diz não ter conversado com Matias ou qualquer representante de postos "nos últimos meses".
'Imensos contatos políticos'
A representação não detalha o conteúdo das conversas com parlamentares, mas afirma que "a organização criminosa investigada possui imensos contatos políticos, os quais são prontamente usados em caso de necessidade".
O texto diz que as ligações foram feitas em um ano sem eleições e diz que "diversos políticos e partidos fizeram pedidos de dinheiro e de combustível a Antônio Matias, por exemplo, como comprovam ligações telefônicas monitoradas".
A influência no meio político seria uma das formas encontradas pelo cartel para evitar o avanço de investigações. Citada como "principal empresa do cartel da revenda", a rede Cascol vende mais de 32 milhões de litros de combustível por mês, faturando R$ 120 milhões durante o período, segundo a PF.
Na representação, o delegado pede a expedição de 24 mandados de condução coercitiva (em que a pessoa é obrigada a depor) e sete de prisão temporária. Na terça, a polícia cumpriu estes e outros 44 mandados de busca e apreensão no DF, no Entorno e no RJ.
A operação foi batizada "Dubai" em referência à cidade-estado do Golfo  Pérsico que enriqueceu graças à exploração das reservas naturais de petróleo e gás. Os mandados envolvem também as empresas Shell e Ipiranga. Segundo o superintendente regional do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Eduardo Frade, o cartel elevava o preço dos combustíveis em até 20%.
Esquema
Por meio de escutas e interceptações de mensagens, os investigadores apontam que a estratégia do grupo era tornar o etanol economicamente inviável para o consumidor, mantendo o valor do combustível superior a 70% do preço da gasolina – mesmo durante o período de safra.
"Com isso, o cartel forçava os consumidores a adquirir apenas gasolina, o que facilitava o controle de preços e evitava a entrada de etanol a preços competitivos no mercado", disse a PF. "De forma simplificada, a cada vez que um consumidor enchia o tanque de 50 litros – já que cada litro da gasolina era sobretaxada em aproximadamente 20% – o prejuízo médio era de R$ 35."
De acordo com o delegado João Pinho, empresas donas de postos mantinham acordo com as distribuidoras, que "avisavam dos aumentos. Havia uma grande cumplicidade", afirmou. Juntas, BR Distribuidora, Ipiranga e Shell detêm 90% do mercado no DF. O delegado disse que o presidente do Sindicato dos Combustíveis do DF, José Carlos Ulhôa, exercia pressão para que os postos continuassem no esquema, por meio de chamadas telefônicas ou em grupos de WhatsApp.
A BR Distribuidora informou que presta "total colaboração com as autoridades nas diligências". "A empresa pauta sua atuação pelas melhores práticas comerciais, quaisquer irregularidades serão investigadas e os responsáveis, punidos", disse a empresa, em nota.
A Ipiranga disse que não teve acesso ao inquérito policial e que vai contribuir “com integridade e transparência, com as informações necessárias aos órgãos de controle”. “As medidas cabíveis serão avaliadas, assim que a empresa obtiver conhecimento do processo.”
A Raízen, licenciada da marca Shell no Brasil, confirmou que um dos funcionários foi conduzido à delegacia e liberado após depoimento. A empresa disse que "age sempre de acordo com a lei, prezando pela ética no relacionamento com todos os seus públicos" e informou colaborar com as investigações.

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